O olhar do outro, o olhar sobre si e a exposição e projeção de si ao outro: modernos e atuais agenciamentos coletivos da subjetividade

George Alves

Resumo


A partir dos anos 30 do século passado a humanidade entra na ‘era do olhar’ quando ocorre a primeira transmissão de imagens na Alemanha e na Inglaterra através da televisão, expandindo e afetando todas as formas do que se pode ver. Desde sempre, porém, o olhar ocupa um lugar de grande importância na nossa maneira de estar no mundo. Os olhares se deslocam e se transformam de acordo com sua posição no tempo e no espaço. A modernidade e os diversos espaços de confinamento como os presídios, escolas, fábricas e as cidades que os contêm inauguram uma inversão de foco do olhar; antes voltado para o soberano, agora vigilante sobre o indivíduo comum. Portanto, a vigilância (e a autovigilância), a norma e os exames são dispositivos que se constituem em campos de visibi­lidade e procedimentos de observação para a compreensão das relações de poder/saber que se formam e que produzem os sujeitos. O foco dos olhares da biopolítica não será mais o individuo no nível do detalhe, como na tecnologia disciplinar, mas, pelo contrário, os mecanismos globais, de equilíbrio e de regularidade, voltados para a população de um modo geral. Neste caso torna-se necessário assegurar uma regulamentação. Na atualidade, o olhar do controle não é mais central, agora ele está disperso, espalhado e presente em diversos setores. É um olhar cada vez mais sutil e menos evidente. As tecnologias da informação e comunicação engendram novas relações entre subjetividade e visibilidade, ocorre uma transformação na maneira como os indivíduos constituem a si mesmos, especialmente a partir da relação com o outro, com o olhar do outro, cresce o desejo de ser visto, de se expor diante do olhar do outro. Com o aparecimento do ciberespaço, surgem também novos dispositivos de vigilância digital para monitoramento de ações, informações e comunicações dos indivíduos, com a função estratégica de montagem de bancos de dados e a elaboração de perfis computacionais, constituindo-se em novas formações de poder e saber. Trata-se, agora, de uma vigilância que se exerce menos com o olhar do que com sistemas de coleta, registro e classificação da informação; menos sobre corpos do que sobre dados e rastros deixados no ciberespaço. O caminho aqui empreendido pretende mostrar ao olhar do leitor algumas lógicas de vida e formas de dominação que estão enquistadas no saber/poder produzido ao longo da modernidade e, na atualidade, a ênfase se volta, sobretudo, para as novas tecnologias. Não há evidentemente qualquer pretensão de traçar uma genealogia.

 


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Referências


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